Exposição Retratistas do Morro é publicada em literatura
- Mayra Barbosa
- 16 de out. de 2024
- 3 min de leitura
Atualizado: 28 de out. de 2024
Projeto é composto pelos acervos dos fotógrafos João Mendes e Afonso Pimenta, construídos desde os anos 60
Mayra Barbosa

Em 2018, uma exposição fotográfica tomou Belo Horizonte. Os moradores do Aglomerado da Serra foram vistos por toda a cidade, depois pelo país e, agora, pelo mundo. O projeto Retratistas do Morro é composto pelos acervos dos fotógrafos João Mendes e Afonso Pimenta construídos desde os anos 60. A ideia de transformar as fotos em exposição veio em 2016, e os acervos pessoais de Misael Avelino e Ana Oliveira também complementam a exposição, além de trabalhos de outros fotógrafos.
Em 2020, os idealizadores trabalharam na criação de um livro, assinado pelos responsáveis pelo projeto e pela Editora Primata, em homenagem ao sucesso crítico e social da exposição fotográfica. Foi feito em um procedimento de angariação de fundos dos interessados, que foi patrocinado pela prefeitura de Belo Horizonte, pelo BDMG Cultural, pelo Artmosphere e pelo Sinergia.
João Mendes, Afonso Pimenta, Misael Avelino e Ana Oliveira são os quatro periféricos. Apesar da exposição não focar nas dificuldades dos moradores, é importante a contextualização para mostrar que a invisibilidade era, com certeza, uma realidade maior para quem é de favela. As pessoas trabalhavam para sobreviver e o lazer era escasso ou retaliado. As histórias deles ficaram escondidas para que as classes abastadas de Belo Horizonte fossem abrilhantadas, mas eles sempre estiveram lá.
Guilherme Cunha, o curador do Retratistas do Morro, pensou nisso como um desdobramento de um projeto artístico e social à base de fotografias que ele já vinha fazendo para a população da
Serra, o Memórias da vila: histórias dos moradores da Comunidade da Serra. O livro foi publicado em 2016, mas, conhecendo um pouco mais dos fotógrafos, o acervo teria um rumo mais profundo, desenvolvido pelos próprios moradores.
A Revista RU3 conversou com Guilherme, que contou que o direcionamento da exposição eram as memórias afetivas dos moradores das oito favelas do Aglomerado da Serra. Devido o fato de poucas pessoas terem poder financeiro para tirar fotos, João, Afonso, Giovani e Joaquim (fotógrafos do acervo de dona Ana Oliveira) foram alguns dos responsáveis pela produção de imagens que ditam a história da região. Nisso, Guilherme e sua equipe entrevistaram João, Afonso, Misael e Ana, guiando a exposição para o campo da memória e separando-a em nichos de seus trabalhos. “Então a partir do entendimento de como eles trabalhavam, a gente elege grupos de imagens para serem digitalizadas que representem esses diferentes aspectos do trabalho deles” , diz Guilherme.
Ao trabalhar com imagem e texto, o livro possibilita uma abordagem do material fotográfico com mais fontes e entrevistas. João Mendes e Afonso Pimenta, pela loja "Foto Mendes", fotografaram o cotidiano por meio de fotos 3x4 em eventos variados da comunidade por décadas. Mas Pimenta também registrou bailes da cultura black em que Misael Avelino produziu e tocou como DJ.
Guilherme enfatizou o peso da resistência da cultura preta no período ditatorial e a desumanização da comunidade por meio das imagens comercializadas por tantos anos. “Quando você tem o distanciamento entre as pessoas ou entre os sistemas de vida que estão produzindo essas imagens, mais o sistema de vida organiza a forma da pessoa pensar. Então, nesse caso, você vê o tanto que as pessoas estão bonitas. Tanto que elas estão assim altivas nas imagens, né? Você vê que é exatamente porque o fotógrafo reconhece essa beleza, porque ele reconhece essa beleza nele mesmo, entendeu?”
Para mais mudanças sociais imagéticas, afinal, como diz Guilherme Cunha: “as pessoas têm o direito igual de existir a partir da preservação da sua própria história”.
O Retratistas do Morro é um projeto criado em 2015. As exposições passaram por Belo Horizonte no CCBB, Palácio das Artes e Memorial Minas Gerais Vale, Sesc Guarulhos e foi exposto no Institut Photo na França. Com princípios de salvaguarda e ressignificação das imagens, também foi exposto na Bienal do Livro de São Paulo, ganhou o Prêmio PIPA em 2023 e produziram tanto o documentário, quanto o livro na pandemia do Covid, para homenagear o projeto.